10 agosto 2005

Carta a quem


Às vezes penso que posso estar enganada como sempre estive.
Como saber ao certo se nada me falas?
O que ocultou antes, agora, calado está para sempre.
Da tua boca não mais a palavra, a letra, o som, o calor, o sabor,
nem ao menos a cor.
Posso praguejar maus pensamentos, perdoe-me.
Sinal da doença de quem nada sabe e tudo quer saber.

Confesso sim, não mais sentir o amor de antes,
chama que se apaga por falta de combustível,
Nunca cinza eterna.
Não desdenhes, não diga que não foi verdade.
Amei como a criança, com a pureza que só ela tem.
Sofri como o carrasco, aquele que levantou a cruz.

Hoje não sei se ainda és carne e calor.
Mas sejas o que fores, fugitivo ou lembrança.
Sei que uma noite saberás.
Nesta doravante...

Ouvi aquela canção, a tua, teu antigo espelho.
Aquele em que não te enxerguei.
Talvez, pensamentos não sintonizados.
Possíveis segredos não compartilhados.
Se o ontem era a verdade que conheci hoje,
culpo-te não ter contado.

Se as que acabo de ler são as preces que repetias em teu leito.
Belas palavras, sábias lições...
Não sei se teu destino.
Esta, minha dúvida eterna.

Desculpe mais uma vez não ter entendido a mensagem.
Eu pensava nessa vida, tu na outra.

"Quando não tiver mais nada, nem chão, nem escada, escudo ou espada, o seu coração acordará...Quando estiver com tudo, lã, cetim, veludo, espada e escudo, sua consciência adormecerá... E acordará no mesmo lugar, do ar até o arterial, no mesmo lar, no mesmo quintal, da alma ao corpo material... Quando não se tem mais nada, não se perde nada, escudo ou espada, pode ser o que se for livre do temor... Quando se acabou com tudo, espada e escudo, forma e conteúdo, já então agora dá para dar amor"